Resumo:
O real teve novo dia de descolamento das principais moedas de países emergentes, com o crescente risco fiscal do Brasil voltando a incomodar os investidores. No final do dia, passou a lira turca, moeda que sofre um derretimento este mês, e teve o pior desempenho no mercado internacional, considerando uma lista de 34 moedas mais líquidas. O dólar acabou recuando ante divisas fortes e de emergentes como México, Chile, África do Sul e Colômbia. No mercado doméstico, fechou no maior nível desde 20 de maio, quando encostou em R$ 5,69.
Profissionais das mesas de câmbio comentam que a inércia do governo na questão fiscal, sobretudo após o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, acusar a base do Planalto de obstruir o avanço das reformas, teve peso decisivo nesta terça-feira para a alta do dólar, dia marcado por fuga de ativos no exterior, em meio ao aumento de casos de covid-19 ao redor do mundo e a percepção de que um pacote de estímulos nos Estados Unidos só vem depois das eleições. A expectativa é que novidades concretas sobre o ajuste fiscal só virão depois das eleições em novembro.
No fechamento, o dólar à vista terminou o dia em alta de 1,20%, cotado em R$ 5,6827. No mercado futuro, o dólar para novembro, que vence na sexta-feira, era cotado em alta de 1,05% às 17 horas, em R$ 5,6855.
“As preocupações fiscais persistem e os preços vão variar a depender das ações do governo nesta área”, afirma a economista-chefe do Banco Ourinvest, Fernanda Consorte.
Neste ambiente, o dólar pode ir de R$ 4,00 para mais de R$ 6,00, a depender de como fica a responsabilidade fiscal do governo. Para 2021, ela projeta a taxa entre R$ 4,80 e R$ 5,00, com o governo cedendo a certas pressões para mais gastos. “Vai ser difícil ver o governo 100% empenhado em compromisso fiscal.”
A economista do Ourinvest observa que a taxa de câmbio, além de mostrar a relação de preços entre duas moedas, se tornou importante medida de risco. E o fato de o real ter se desvalorizado o dobro este ano quando comparado a outras moedas emergentes mostra que há fatores internos contribuindo para aumentar a percepção de risco do País. Entre estes fatores, o principal é o fiscal, disse ela em conversa com jornalistas. Por isso, a previsão é que a divisa dos EUA não volta tão cedo no Brasil ao nível pré-pandemia.
O Bradesco (SA:BBDC4) também alertou nesta terça-feira para os riscos fiscais e vê um cenário de incerteza persistindo pela frente. “A situação das contas públicas ainda inspira cautela, já que existem riscos voluntários e involuntários de rompimento do teto dos gastos”, ressaltam os economistas do banco em relatório de revisão do cenário.
O banco leva em conta que não haverá flexibilização do teto, postergação do estado de calamidade ou eventual extensão do auxílio emergencial fora do teto de gastos, mas observa que o clima de dúvidas vai prosseguir. Com isso, o dólar deve encerrar o ano em R$ 5,40.
As mesas de câmbio monitoram também a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que começou nesta terça, e a dúvida é o que o BC vai falar dos riscos fiscais e da aceleração da inflação. O consenso no mercado é por manutenção dos juros e o interesse maior é ver como virá o comunicado final da reunião.