Resumo:Este artigo analisa como a escassez de pesos tem impulsionado a venda de dólares, a surpreendente valorização do peso e as implicações para o mercado forex e a economia argentina.
Em 14 de abril de 2025, a Argentina deu um passo ousado ao suspender os rígidos controles cambiais, conhecidos como “cepo”, que limitavam a compra de dólares desde 2019. Sob a liderança do presidente Javier Milei, a política monetária do país foi reformulada com a introdução de um regime de bandas cambiais, permitindo que o peso argentino flutuasse entre 1.000 e 1.400 pesos por dólar. Apoiado por um novo empréstimo de US$ 20 bilhões do Fundo Monetário Internacional (FMI), o governo busca estabilizar a economia, recompor as reservas do Banco Central da Argentina (BCRA) e combater a persistente inflação. Este artigo analisa como a escassez de pesos tem impulsionado a venda de dólares, a surpreendente valorização do peso e as implicações para o mercado forex e a economia argentina.
A liberalização cambial foi uma resposta à necessidade de corrigir distorções econômicas causadas pelo “cepo”, que restringia o acesso a moedas estrangeiras, dificultava o comércio e afastava investimentos. Até abril de 2025, pessoas físicas estavam limitadas a comprar apenas US$ 200 por mês, enquanto empresas enfrentavam barreiras para repatriar lucros ou pagar importações. Essas restrições alimentaram um mercado paralelo, onde o dólar blue era negociado a cotações significativamente mais altas que a taxa oficial, refletindo a escassez de dólares e a desconfiança no peso.
Com o acordo com o FMI, que incluiu um desembolso inicial de US$ 12 bilhões, o BCRA elevou suas reservas para cerca de US$ 39 bilhões, proporcionando maior segurança para sustentar a base monetária. A nova política monetária substituiu o sistema de crawling peg (desvalorização controlada) por um regime de câmbio flutuante administrado, no qual o banco central intervém apenas se o peso ultrapassar os limites da banda (abaixo de 1.000 ou acima de 1.400 pesos por dólar). Essa mudança visa atrair investimentos, aumentar a competitividade das exportações e promover a remonetização da economia.
Contrariando as expectativas de uma forte desvalorização, o peso argentino apresentou uma valorização surpreendente após a liberalização. Em 22 de abril de 2025, a moeda registrava alta de 0,55%, cotada a 1.088 pesos por dólar, após iniciar a semana passada na faixa de 1.290 pesos. No mercado paralelo, o dólar blue recuou 16,4%, para 1.150 pesos, enquanto as cotações MEP e CCL, usadas por empresas e exportadores, caíram 17,1% e 16,4%, respectivamente. Essa convergência entre as taxas oficial e paralela indica maior confiança na política monetária de Milei.
A escassez de pesos no mercado tem sido um fator determinante para essa valorização. Com a demanda por moeda local superando a oferta, operadores têm liquidado posições em dólares para obter pesos, incentivando o chamado carry trade. Nesse tipo de operação, investidores especulam com o peso, aproveitando a expectativa de sua valorização dentro da banda cambial para obter retornos em dólares no futuro. A habilitação do Mercado de Câmbio Livre (MLC) para não residentes também atraiu investidores estrangeiros, aumentando a oferta de dólares e pressionando a cotação da moeda americana para baixo.
O economista Fausto Spotorno, da consultoria OJF, destacou que a falta de pesos no mercado, combinada com o aumento da concorrência, está mitigando pressões inflacionárias importadas por um peso mais fraco. “O mercado também está dizendo que não tem dinheiro,” afirmou Spotorno, sugerindo que a baixa liquidez em pesos está forçando uma reavaliação das estratégias de investimento.
A valorização do peso trouxe alívio temporário aos temores de uma retomada da inflação, que já foi reduzida de um pico de 25% ao mês no final de 2023 para 3,7% em março de 2025. Analistas consultados pela Reuters estimam que a inflação de abril ficará entre 3% e 5%, um aumento em relação aos meses anteriores, mas abaixo das previsões iniciais de mais de 5%. A contenção da inflação é crucial para o governo Milei, que prioriza a estabilização econômica e a recuperação do poder de compra dos argentinos.
No entanto, a liberalização cambial não está isenta de riscos. A desvalorização inicial de cerca de 10% do peso na abertura dos mercados em 14 de abril gerou preocupações entre comerciantes, que temiam repassar custos de reposição mais altos aos consumidores. Produtos importados ou com insumos dolarizados enfrentaram pressões de preço, mas a demanda deprimida e a escassez de pesos limitaram aumentos significativos. “Não esperamos um impacto imediato sobre os preços,” afirmou Spotorno, apontando que a dinâmica de mercado está compensando os efeitos de uma moeda mais fraca.
O acordo com o FMI foi fundamental para viabilizar a liberalização cambial. Além do aporte inicial, o pacote total de US$ 20 bilhões, complementado por US$ 12 bilhões do Banco Mundial e US$ 10 bilhões do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), fortalece a capacidade do BCRA de intervir no mercado, caso necessário. A meta do governo é alcançar reservas líquidas positivas de US$ 4 bilhões até o final de 2025, revertendo o atual déficit de US$ 7 bilhões.
O ministro da Economia, Luis Caputo, tem enfatizado que a liberalização não é uma desvalorização, mas uma transição para um câmbio flutuante que reflete a oferta e a demanda. Em uma postagem na rede social X, Caputo criticou previsões pessimistas, afirmando: “O dólar está atualmente em 1.065, abaixo do dólar oficial antes da suspensão dos controles cambiais. Fizemos o que dissemos que faríamos.” Sua viagem aos Estados Unidos para as reuniões de primavera do FMI e do Banco Mundial, onde se encontrará com a diretora Kristalina Georgieva, reforça o compromisso com as metas do acordo, que incluem superávit fiscal e acumulação de reservas.
Para traders no mercado forex, a nova dinâmica cambial da Argentina apresenta tanto oportunidades quanto desafios. A banda cambial oferece um intervalo previsível para especulação, especialmente com o carry trade, que se beneficia da valorização do peso e da alta liquidez em dólares. A remoção de restrições para pessoas físicas e a flexibilização para empresas, como a autorização para repatriar lucros a partir de 2025, aumentam o fluxo de capitais, potencializando a volatilidade no par USD/ARS.
No entanto, a sustentabilidade da valorização do peso depende de fatores como a confiança na política de Milei, a estabilidade das reservas e a evolução da inflação. A proximidade das eleições legislativas de outubro de 2025 adiciona incerteza, já que movimentos políticos podem influenciar a percepção do mercado. Traders devem monitorar indicadores como o S&P Merval, que subiu 4,7% após a liberalização, e o dólar blue, que serve como termômetro do sentimento informal.
A liberalização cambial marca um divisor de águas na economia argentina, com a escassez de pesos impulsionando a venda de dólares e a valorização do peso desafiando as expectativas de desvalorização. O suporte do FMI e a recomposição das reservas do BCRA criam um ambiente favorável para a estabilização, mas os desafios persistem, especialmente no controle da inflação e na atração de investimentos de longo prazo. Para traders e investidores, a Argentina oferece um cenário dinâmico, com oportunidades no mercado forex impulsionadas pela nova política monetária.
A gestão de Milei está cumprindo sua promessa de desmantelar controles rígidos, mas o sucesso dependerá da capacidade de manter a confiança do mercado e evitar choques inflacionários. Enquanto o peso se fortalece, a Argentina entra em uma fase de transição que pode redefinir sua trajetória econômica, desde que os pilares do ajuste fiscal, equilíbrio monetário e acumulação de reservas sejam mantidos.
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